Avó menina...


- Veja esta foto. É de sua avó.
Meu pai, com expressão de felicidade poucas vezes vista em seu rosto, me mostra o retrato de uma jovem. Fotografia antiga, em preto e branco com uma grande mancha, parecendo ser de alguma fruta vermelha. Olho, curiosa, para a foto daquela cujo rosto não cheguei a conhecer; mas apenas alguns detalhes de sua história.
- Veja sua avó Maria - me diz meu pai novamente, mostrando outra foto. Agora vejo uma menina, com uns cinco anos de idade. Usa um aventalzinho branco sobre o vestido, tem cabelos levemente ondulados e um rostinho bonito e feliz. A seu lado uma mulher, talvez sua mãe, de vestido longo, também de avental, cabelos presos num coque, batendo um bolo numa tigela alta de louça. A menina brinca feliz, correndo pra cá e pra lá. Percebo que não olho simplesmente uma foto e sim assisto a uma cena. Contemplo a menina, tão alegre ali, e penso, com tristeza, na vida difícil que teve depois. Foi mãe de oito filhos, esposa de um operário, sofria de enxaqueca, passou pelas dificuldades de tempos de guerra, perdeu um filho jovem num acidente, viajou de navio como imigrante para o Brasil e veio a falecer, sem ter alcançado a velhice, na colônia alemã de Uvá, em Goiás; sem atendimento médico, nem outros recursos.
Este pensamento triste se afasta e me deixo envolver pela felicidade com gosto de paz que vem daquela menininha contente e do brilho que vejo nos olhos de meu pai.
Acordo em meu quarto. Já amanheceu. Fecho os olhos tentando voltar ao sonho bonito, em vão. Não tem importância. O sonho se fora, mas aquele sentimento de paz, de felicidade ainda perdura em meu coração. Começo um novo dia com um sorriso nos lábios...